Na hinterlândia platina criaturas repulsivas vicejam no interior das pessoas à mando de lo diabão. Cabe a um pequeno grupelho misantropo o combate contra o mal.
O mal que nos habita (Cuando acecha la maldad), 2023. Argentina. De Demián Rugna.
Argentinos criaram uma própria versão de apocalipse zumbi ao tematizar acerca de um mal: os infectados ou infestados que se espalham de um lugar a outro. As entidades são expressões da corrupção causada pelo demônio nas pessoas e nos animais. Um tipo de mal que se prende tanto nos lugares e nas coisas quanto nos seres vivos.
A narrativa inicia-se justamente com a identificação de um infectado em uma zona rural. Afastados da civilização, os moradores locais precisam lidar com o diabo em meio ao receio e à apatia das autoridades locais (altamente incompetentes pelo visto). No entanto, a medida em que a narrativa acelera a ritmo, o cenário se torna urbano com o senso de isolamento perdendo a importância, inclusive o deslocamento da cidade para o vilarejo parece se tornar mais frequente – uma fragilidade da premissa inicial.
A fim de criar uma atmosfera de total impotência, muitos artefatos e aliados do nefasto vão aparecendo ao longo da projeção e, desse modo, o mal que espreita parece inevitável. Assim, animais, doentes, corpos e crianças tornam-se emissários do maligno. Acentua-se, assim, uma outra noção que é a do desespero, pois o mundo sem Deus não é necessariamente um mundo sem o diabo. A estética contida e a narrativa sóbria privilegiam o psicológico em detrimento do asco. Terror com toques de drama familiar: diante do adoecimento das relações afetivas, a solidão, a raiva, o abandono e o enlouquecimento são a oportunidade aguardada para a materialização da maldade.
Não obstante um visual de terror requintado cuja âncora se dá na tragédia familiar – um psicologismo comum desses dias – há forte verve Trash na narrativa – não pela estética, mas pela facilidade com que desafios vão sendo acrescentados sem uma preocupação de amarrar muito bem a cosmogonia do universo apresentado. Um filme confuso e desequilibrado, mas capaz de, até certo ponto, assustar os desavisados com a lembrança de que se Deus está morto o diabo vai muito bem obrigado.
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